E, subitamente, o Portugal das redes sociais, dos comentadores políticos e das televisões e dos jornais, ou seja, o Portugal que conta, deixou de ter assunto! É que a Festa do “Avante!” acabou e, ao contrário do que muita gente supunha ou desejava, todas as normas de segurança e prevenção sanitárias foram integralmente cumpridas, não deixando margem para especulações! Antes de continuar devo fazer a minha declaração de interesses: sou membro do Partido Comunista Português, pelo que a minha isenção na análise deste episódio pode ser questionada.
Assim que o PCP anunciou a vontade de realizar o evento, assistiu-se a um desfilar de histeria que, em vários casos, roçou a completa loucura! Escreveram-se e disseram-se as maiores barbaridades, montou-se um cenário de catástrofe ou tragédia anunciada, sem precedentes na ainda curta história da pandemia. Insinuaram-se ligações tenebrosas, agitou-se o perigo dos contactos físicos descontrolados, gerou-se uma situação de completa hipocrisia, que ainda continua. Enumero aqui meia dúzia de acontecimentos que já tiveram lugar, ou que ainda se realizarão, com os quais concordo plenamente e reconheço a justeza da sua realização, mas que não mereceram nenhum tipo de comentário dos que tanto criticaram e tanto zombaram da realização comunista: as Feiras do Livro de Lisboa e do Porto, ambas com uma relação nº de visitantes/espaço disponível inferior aos 30 hectares da Quinta da Atalaia; a tradicional Peregrinação dos Emigrantes a Fátima no 13 de agosto; a realização anunciada do Grande Prémio de Portugal em Fórmula 1 e do Grande Prémio de Motociclismo, ambos integrando os respetivos Campeonatos Mundiais e ambos a terem lugar, durante o Outono, no Autódromo do Algarve, que juntarão vários milhares de pessoas, em áreas também inferiores à da realização do “Avante!”. Até o Presidente da República, cada vez mais comentador e menos presidente de todos os portugueses, se referiu à Festa de forma deselegante, para dizer o mínimo. Que saudades de há cinco anos quando, em plena pré-campanha eleitoral, Marcelo, então candidato, se deslocou à Quinta da Atalaia, com um enxame de jornalistas atrás, para mostrar como era tolerante e democrata. Se fosse preciso um exemplo para ilustrar o que é hipocrisia…
A campanha de descredibilização não se ficou por aqui. Houve providências cautelares para impedir a realização da Festa, houve um grupo de lojistas que, alarmado com as notícias resolveu fechar portas, um coletivo de sessenta viaturas da Amora efetuou uma marcha lenta a protestar contra o evento. Gostava de saber quantos desses cidadãos frequentaram praias lotadas durante a época balnear, por exemplo. Vários jornais e comentadores em televisões disseram que para o PCP era imperioso realizar a Festa porque significava a sua sobrevivência financeira. Mas, afinal, não! Os jornais “Expresso”, Público” e “JN” publicaram artigos no fim de semana da Festa criticando o facto de haver prejuízo nos últimos cinco anos. O “Expresso” fez até disso o título principal da sua edição de 4 de setembro. As reportagens das televisões durante a Festa foram unânimes a compararem com edições anteriores, referindo a pouca afluência. Pois se se limitou a um sexto a capacidade do local, como queriam que estivesse o mesmo número de pessoas de outras edições? Também foi posta a circular, nos 3 ou 4 dias que antecederam o evento, que o PCP continuava a vender entradas, apesar de já ter excedido o número estipulado pela DGS. É preciso não conhecer o PCP e a Festa do “Avante!” para não saber que existem sempre centenas de pessoas que compram as EP (bilhetes de entrada) como se se tratasse de uma doação ao partido.
O ódio à festa comunista foi tanto que falsos inspetores do Município do Seixal visitaram estabelecimentos da área geográfica dizendo que era obrigatório permanecerem encerrados nos dias da realização. Soube-se deste facto por denúncias de vários comerciantes. Já depois de concluída a Festa ainda as redes sociais continuam a denegrir com falsidades o acontecimento. Dou dois exemplos: apresentação de uma fatura de uma imperial e uma carcaça, passada às 23.00 horas de sábado, com o comentário “O PCP vendeu bebidas alcoólicas depois das 20.00 horas, ao contrário do que está legislado”. Ora acontece que tal venda foi feita num espaço de restauração, o que é permitido por lei e pode acontecer em qualquer restaurante do país; alegadamente o Município do Seixal, de gestão comunista, teria adquirido WC portáteis para serem utilizados na Festa, num claro favorecimento ao partido. Investigado o facto soube-se que tal aquisição se destina aos trabalhadores do Município, no âmbito do combate à pandemia. Mais, as WC portáteis só esta semana serão entregues pelo fornecedor.
Nada disto é surpreendente. Porque nunca foi a Festa do “Avante!” que esteve em causa, mas sim o seu organizador, o PCP! Custa-me perceber como um partido que representa menos de dez por cento do eleitorado seja tão atacado. Mas isso significa que o papel do partido na sociedade portuguesa vai muito além da sua representação parlamentar. A forma como o grande capital e os partidos de direita se empenharam na tentativa de impedirem a realização da festa comunista revelou que, apesar das várias mortes anunciadas, o PCP ainda é o principal bastião dos direitos mais básicos dos trabalhadores. Quando, por ocasião do 1º de Maio, houve uma histeria parecida por causa de uma pequena manifestação da CGTP, fiquei à espera que os detratores viessem reconhecer que, afinal, as medidas tomadas evitaram o risco de contágio. Agora já não espero a honestidade intelectual de ver reconhecido o esforço, a qualidade e o respeito integral pelas normas de prevenção sanitária, de quem organizou um evento da magnitude e importância da Festa do “Avante!”◄