No mês passado falei do filme, “Asas do Desejo”, a propósito de Berlim, uma metrópole à procura de um lugar, instável, povoada de ambiguidade e expectativa. Este estranhamento pode ser similar à imagem ou sentimentos do homem pós-guerra ou, pelo menos, à ideia e representação mais ou menos romântica que temos sobre o homem de pós-guerra, mas também no território da rutura e da resistência.
O estranhamento em relação às cidades foi caracterizado por Charlie Chaplin em Modern Times, onde o homem moderno é ridicularizado no contexto de um cenário fabril supostamente evoluído, moderno e organizado. O alvo, contudo, é o capitalismo industrial cujo lado sombrio separa o homem dos seus sonhos, e assim evolui o homem para homem-máquina. Ao mesmo tempo que se dá esta alienação entre o homem e o seu trabalho, Freud brinda-nos com o termo ‘uncannny’ e a sua relação com o ‘corte de memória’, relacionando-o com um conjunto de patologias psicológicas (claustrofobia, ansiedade, etc.) associadas a momentos disruptivos da história como as guerras e ou ainda o choque petrolífero (Anthony Vidler the architectural uncanny,1992).
Esta alienação entre o homem e o trabalho, a par de cidades industrializadas que são construídas para darem lugar a benditas indústrias, para além de destruírem o sonho do homem-vagabundo, vão deixando o sentimento de nostalgia entre o homem e o lugar onde nasceu. Ainda há dois dias me sentei numa esplanada e ouvia um senhor: ‘o que me mais me custa é ir à terra e não poder entrar na casa onde nasci. Venderam-na!’ (este senhor, por acaso, inspirou-me para escrever sobre este tema). Paralelamente ao senhor que no filme, “As Asas do Desejo”, se sentava num banco no meio de uma cidade destruída e desconhecida à procura de alguma réstia de familiaridade.
As ruínas, as margens, os espaços em aberto foram destruídos para serem vendidos e gentrificados. Tais espaços eram espaços para respirar, espaços de resistência contra o movimento. Positivamente, noto uma mudança na arquitetura que se faz hoje que toca este ponto, em algumas cidades claro, revi em Lisboa, como sempre revi um ponto entre o antigo, o tradicional, em resistência ao movimento; o mesmo encontrei em Barcelona. Porque realmente se construíram movimentos de resistência em bairros como Alfama, que foi ocupado por atividades artísticas, culturais, afim de darem voz às pessoas do bairro, afim de não lhes serem retiradas as casas.
A arquitetura tem-se moldado a estes espaços de resistências, respondendo a cada lugar e a cada momento de ‘reivindicações’ bem como à sua constante mutação (de objetos, valores sociais, estruturas políticas e económicas), não obedecendo apenas às leis do capital. ◄

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