Começo com uma frase do livro “D. Quixote de La Mancha” escrito por Miguel de Cervantes, no início do séc. XVII, “Mudar o mundo, meu amigo Sancho, não é loucura, não é UTOPIA, é justiça!”
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), a definição mais conhecida de SUSTENTABILIDADE refere-se a «um modelo de desenvolvimento que permite satisfazer as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações satisfazerem as suas próprias necessidades».
Relembro que a palavra “SUSTENTÁVEL” (apoiado em si mesmo) nada tem a ver com “SUSTENTADO” (apoiado em algo) e tantas vezes dito erradamente por decisores políticos! Se a primeira renova recursos, a segunda tende a esgotá-los e é bom relembrar que o que está em causa é o valor, sem preço, da vida, ou seja, a continuidade da espécie humana neste maravilhoso planeta que irá continuar “vivo”, por muitos milhões de anos, independentemente, da nossa existência.
Para conhecimento geral, enumero, de forma sintetizada, os 17 Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável (ODS) definidos pela ONU para 2030… 1) Erradicar a pobreza; 2) Erradicar a fome; 3) Saúde de qualidade; 4) Educação de qualidade; 5) Igualdade de género; 6) Água potável e saneamento; 7) Energias renováveis e acessíveis; 8) Trabalho digno e crescimento económico; 9) Indústria, inovação e infraestruturas; 10) Reduzir as desigualdades; 11) cidades e comunidades sustentáveis; 12) Produção e consumos sustentáveis; 13) Ação climática; 14) Proteger a vida marinha; 15) Proteger a vida terrestre; 16) Paz, justiça e instituições eficazes; 17) Parcerias para a implementação dos objetivos!
Será importante levar em frente estes objetivos, assinados em dezembro de 2015, no Acordo de Paris, sem UTOPIA, mas com REALIDADE de mudança, para atingir a meta de evitar o aumento médio da temperatura global em 1,5ºC até 2030! A verdade é que, e infelizmente, os anos passam e muitos dos objetivos continuam por cumprir pela quase totalidade dos países do mundo! Como exceção, e curiosamente, Marrocos e a Gâmbia são os únicos países, até ao momento, no caminho da meta ambiciosa da DESCARBONIZAÇÃO 0 (zero), a qual exige uma queda de 55% nas emissões totais de gases com efeito de estufa até 2030 e de 100% até 2050.
Será que a pandemia ficará para a estória do ser humano como o “grande acelerador” para o combate definitivo à SUSTENTABILIDADE do planeta?! Não sei, tenho muitas dúvidas, mas, pelo menos, veio-nos provar que a DESCARBONIZAÇÃO é possível porque tudo passa por uma questão de escolhas dum longo caminho a percorrer!
É evidente que o problema não é o ser humano adaptar-se a ambientes mais ou menos hostis, ou seja, quentes, frios, chuvosos, gelados…, o problema é a instabilidade do SISTEMA CLIMÁTICO GLOBAL, cujo aumento da temperatura acima dos 2ºC irá ter como uma das principais consequências, o degelo de grandes massas, como por exemplo, e mais próximo da Europa, a Gronelândia, que irão contribuir para o aumento do nível das águas do mar e, consequentemente, uma catástrofe humana nas áreas litorais onde vivem vários milhões de pessoas. O grave problema das alterações climáticas é de responsabilidade mundial, intercontinental, continental, nacional, regional, local e individual porque este combate, e à semelhança do período pandémico que estamos a viver, começa em cada um de nós. Segundo, alguns especialistas, e com os quais eu concordo, o primeiro e premente passo a dar pelos decisores políticos, será a visão global para a criação duma inexistente LEI DE BASES DO CLIMA.
No dia 21 de julho de 2020, os dirigentes dos países da UE aprovaram um orçamento global de 1824,3 milhares de milhões de euros (mM€), dividido entre o Quadro Financeiro Plurianual 2021-27 (1074,3 mM€ e o Next Generation EU (750 mM€) como reforço na recuperação da pandemia Covid-19 e do investimento na transição ecológica e digital. Como imposição, 373,9 mM€ (+20%) deste orçamento terão que ser investidos em Recursos Naturais e Ambiente. Do bolo, Portugal irá receber 45 mM€, dos quais aprox. 9 mM€ investidos no Fundo Ambiental que tem por finalidade apoiar políticas ambientais para a prossecução dos objetivos do DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL, contribuindo para o cumprimento dos objetivos e compromissos nacionais e internacionais, designadamente os relativos às alterações climáticas, aos recursos hídricos, aos resíduos e à conservação da natureza e biodiversidade. É preciso estar atento aos AVISOS no site do Fundo Ambiental como uma excelente oportunidade para autarquias, estabelecimentos de ensino e associações locais apresentarem atempadamente os seus projetos e candidaturas em diferentes dotações que assentam em três grandes pilares; economia circular, valorização do território e descarbonização esperando que haja uma ampla e justa distribuição do dinheiro, sem fraude, corrupção e excesso burocrático!
Relembro também que o Grupo de Trabalho da UE para a SUSTENTABILIDADE refere, no seu último relatório, que as comunidades em geral contribuem mais para a mitigação das questões ambientais do que as tecnologias para a redução do CO2 e aponta sete passos, a saber; 1) Movendo-se além do crescimento, 2) Nutrir Ecologias Comuns, 3) Regeneração Eco-Social, 4) Economia Solidária, 5) Governança Inclusiva, 6) Inovação Social Transformativa e, por fim, 7) Viabilização da ação liderada pela comunidade.
Neste sentido, contrariando a UTOPIA e apelando à REALIDADE, em França, assim como nos países nórdicos, nos últimos anos surgiram dezenas de bairros ecológicos de sucesso onde é possível coabitarem pessoas de diferentes estratos sociais, mas todos com a mesma consciência ambiental e metas comuns bem definidas. Para os mais curiosos, e entre várias dezenas de projetos em curso, posso referir, como exemplo, o bairro ecológico La Caserne de Bonne (2500 hab.), na cidade francesa de Grenoble ou o Confluence (20000 hab.), em Lyon.
É preciso perceber que o princípio do DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL se aplica desde o planeta até às nossas casas e assenta em 4 pilares fundamentais; 1) o ecologicamente correto, 2) o economicamente viável, 3) o socialmente justo e 4) o culturalmente diverso!
Sabemos que mudar mentalidades é trabalhoso e moroso, sobretudo, num mundo extremamente consumista como o atual, no entanto, uma forte aposta na educação para a SUSTENTABILIDADE é parte da solução! Existem inúmeras atitudes, comportamentos e gestos que ocupariam, certamente, uma página deste jornal e que fazem toda a diferença no nosso dia-a-dia com benefícios inequívocos para todos, sobretudo, ambientais, económicos, sociais e culturais. Ser um ser sustentável não é UTOPIA, é REALIDADE!
Como costumo dizer, viver no concelho de Reguengos de Monsaraz, é ter a possibilidade de usufruir de um dos locais mais belos do mundo associado a uma qualidade de vida ímpar que não tem valor monetário! Conseguem imaginar um CONCELHO ECOLÓGICO, respeitando o aproveitamento sustentável do território, sobretudo, ao nível da água, dos resíduos, da biodiversidade, da mobilidade, da poupança e eficiência energética com recurso a energias limpas – no nosso caso, enorme potencial na fotovoltaica –, da densidade populacional, do urbanismo, … será UTOPIA ou REALIDADE?! Diria, provavelmente um pouco das duas, no entanto, acredito que o concelho de Reguengos de Monsaraz tem condições territoriais favoráveis e de clima, provavelmente o melhor do mundo, para enveredar pelo caminho da SUSTENTABILIDADE consciente minimizando impactos, fugindo à UTOPIA a caminho da REALIDADE! Assim haja coragem e determinação nas decisões futuras para que possamos ser um exemplo para o país e para o mundo!
Enquanto pessoa livre, nunca tive qualquer ambição política partidária na vida, mas jamais deixarei de exercer o meu direito de cidadania ativa em democracia como forma de empoderamento pessoal e, simultaneamente, comunitário nas decisões locais acreditando que quem governa possa também mudar a forma de ver o mundo! É preciso massa crítica porque ninguém é dono do saber e verdade absoluta, sobretudo, num mundo dinâmico e exigente como o nosso!
Antes de terminar, não posso deixar de felicitar a jovem reguenguense, Alice Faísco, vencedora do Concurso Nacional de Escrita, “A melhor carta de 2020”, promovido pela Fundação Portuguesa das Telecomunicações, com um brilhante e criativo texto! Acredito que a ALICE DO PRESENTE não irá desiludir a ALICE DO FUTURO da mesma forma que nós HOJE temos o compromisso de não desiludir as GERAÇÕES DO AMANHÃ e é, por isso, que o FUTURO É HOJE!
Termino novamente com uma frase do livro de Cervantes, “Quando se sonha sozinho é apenas um sonho, quando se sonha juntos é o começo da REALIDADE!” Um ótimo e feliz dia para todos! ◄
- Publicado em PALAVRA novembro 2020