Fui apanhada de surpresa, confesso. Tinha feito o planeamento para as primeiras semanas de outubro, de acordo com as atividades previstas e os compromissos assumidos. Era um planeamento simples, tendo em conta os tempos de incerteza que se vivem e a necessidade quase imperiosa de se fazerem adaptações, mas era um planeamento. Um planeamento registado ao longo das páginas da agenda, com anotações sublinhadas, setas de ligação, cores e até um ou dois rabiscos que só eu entendia.
O email que recebi a 5 de outubro, recordando um compromisso a cumprir até dia 8 do mesmo mês, causou-me algum desconforto. Na verdade não me tinha esquecido do compromisso, simplesmente, nem sei bem porquê, tinha-o registado no mês de novembro e por isso não fazia parte do meu planeamento. Com alguma apreensão, misturada com uma pontinha de ceticismo, consultei a informação recebida no final de dezembro de 2019, onde constava o agendamento trimestral para 2020, da atividade, com a qual me tinha comprometido. Às vezes, quem sabe, podia ter havido um engano (pouco provável), e o email de dia 5 não ser para mim.
Li atentamente a informação de modo a que nada escapasse, e… batia tudo certo; outubro era o mês em que me tinha comprometido. “Raios, como é que me enganei?”, primeiro pensamento. Pensamento e pergunta parva, própria de alguém que raramente se engana, o que não é o meu caso. Na verdade, mesmo com a agenda onde tudo é anotado e com a qual mantenho uma relação de dependência total, algumas vezes me engano.
“Ok, acontece, errar é próprio da natureza humana e um engano é um erro”, segundo pensamento. Com o meu discurso interno alicerçado nesta expressão corriqueira, tentei colmatar o meu desconforto, procurando desvalorizar o sucedido num processo de auto consolação.
Não funcionou! Mesmo sabendo que o erro tem probabilidades de existir, o que estava em causa era um compromisso assumido cuja realização poderia estar comprometida, o que, de acordo com os valores que me foram incutidos no seio familiar, não poderia acontecer, porque os compromissos são para cumprir.
Senti o peso dessa obrigação, esbocei um sorriso de concordância e de modo quase incontrolável, pensei numa série de compromissos, palavras e acordos proferidos por uma multiplicidade de pessoas, nos mais variados contextos, e que não são cumpridos.
O compromisso de que a justiça é igual para todos os cidadãos independentemente do género, raça, condição social, crença politica ou religiosa. O compromisso de que os políticos eleitos pelo povo, exercerão o cargo como seus representantes e nunca em proveito próprio. O compromisso de que as forças de segurança são um conjunto de pessoas com preparação específica para garantir a segurança individual e coletiva, e não um conjunto de pessoas que exerce o poder através da força descontextualizada, transformando-a em violência. O compromisso de que a família será uma micro sociedade construída de amor e não de violência, onde as crianças serão amadas e os idosos não serão abandonados. O compromisso de que todo o trabalhador receberá um salário justo e não será explorado. O compromisso de que todas as pessoas serão bem tratados nas unidades de saúde e que os profissionais que aí trabalham exercerão a sua profissão com zelo e profundo respeito pela vida e dignidade humana. O compromisso de que todas as pessoas têm direito à educação e que os professores serão verdadeiros veículos de conhecimento e socialização, recusando toda e qualquer postura discriminatória.
Envolta neste pensamento, o terceiro, percebi que os compromissos são múltiplos, sucessivos e de complexidade variável.
No fundo, todo o nosso quotidiano é pejado de compromissos da mais variada espécie, de acordo com o papel que desempenhamos em cada momento. É impossível não nos comprometermos, porque a vida em si mesma já é um compromisso, cabendo a cada um a responsabilidade de o assumir ou não.
Quanto a mim, relativamente ao compromisso que tinha assumido para o mês de outubro, cumpri-o integralmente, através do escrito que acabaste de ler. E tu, o que vais fazer com os teus compromissos? ◄

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