Começo a reflexão do tema supracitado com uma anedota que passo a contar.
“Eram sete horas da manhã quando o pai bate à porta do quarto do filho.
– Filho, levanta-te que já estás atrasado para ires para a escola.
– Pai, eu não quero ir para a escola.
– Mas por quê, filho?!
– Estou farto da escola.
– Mas és tu o professor!”
As políticas desastrosas do Ministério da Educação (ME) traduzidas na incompetência dos ministros da educação, sobretudo, nestas duas últimas décadas, têm contribuído, inequivocamente, para uma classe docente profissionalmente, desmotivada, economicamente, mais pobre e, coletivamente, desunida. Infelizmente, é esta a realidade vivida nos estabelecimentos de ensino do nosso país, duma Escola que se diz democrática, livre e para todos, balelas!
Uma Escola que atribui o poder a uma única pessoa não é democrática, mas, sim, de pensamento totalitário, controladora e politizada. Na prática, o poder pode ser cedido a alguém, entenda-se, e vejam que nome pomposo, diretor, que até pode vir lá do cu de judas, sem conhecer a realidade escolar local, mas que irá dirigir sempre sob a alçada dos senhores lá de Lisboa com os seus rabinhos sentados em cadeiras almofadadas, será isto uma escola democrática?! Não é, certamente. Entendo que devem ser as comunidades educativas locais representadas, maioritariamente, por docentes, o que não acontece, atualmente, e reflexo dum claro desprezo pela classe, a decidirem, democraticamente, o melhor caminho a seguir em prol dos seus alunos integrando, obviamente, representantes de instituições ligadas direta ou indiretamente à educação cujo apoio será sempre imprescindível para o sucesso desejado. As escolas não precisam de ser dirigidas, mas lideradas, sobretudo, por pessoas consensuais, íntegras e conhecedoras, não só da instituição de ensino, mas também da realidade socioeconómica da comunidade escolar.
Uma Escola burocratizada até à folha de papel, e sem entrar em pormenores dos infindáveis afazeres obrigatórios dos docentes, sobretudo, nos últimos anos, que preencheriam, certamente, uma folha A4, que tem conseguido levar ao esgotamento físico, mental e emocional (burnout) a maioria dos docentes, é tudo, menos livre. Na oferta duma falsa autonomia, perdem-se horas com papelada em detrimento da dedicação dos docentes a estratégias produtivas de transmissão de conhecimento aos seus alunos. Tristemente, esgotam-se os docentes retirando-lhes o prazer de ensinar com consequências na aprendizagem dos alunos.
Uma Escola para todos que da inclusão faz a sua bandeira, mas exclui docentes com a conivência do Presidente da República (PR) ao homologar o Decreto-Lei n.º 41/2022, de 17 de junho conjugado com o disposto no Despacho n.º 7716-A/2022, de 21 de junho do ministro da educação e ex-secretário de estado, com o objetivo claro de atenuar a trapalhada da Mobilidade por Doença do ano letivo 2022/23 que por falta de tempo iria provocar danos no arranque das atividades letivas, permitiu desterrar mais de 3 mil docentes ignorando direitos fundamentais de pessoas com problemas graves de saúde, uma vergonha! O ato irrefletido do PR que todos sabemos que também é professor de direito, mas que desconhece, e que a grande maioria da classe docente também desconhece, por exemplo, que há casos de docentes doentes terem de regressar aos arquipélagos da Madeira e dos Açores ficando longe dos seus familiares mais chegados, no fundo, aqueles que lhes dão o tão necessário apoio diário, mas como diria o Bertolt Brecht, “… não me importei com isso…” porque não é comigo. Para estes docentes o PR não teve tempo para beijinhos e abracinhos! O futuro provará a inconstitucionalidade da lei do ignóbil ministro da educação que se lembrou de inventar um mínimo de 6 horas letivas atribuídas a estes docentes como travão à MpD e, num pensamento hitleriano de medir a distância entre localidades em linha reta! Uma burrice de quem não conhece a realidade das escolas do ensino básico público e parece não viver neste mundo. O ministro da educação precisava de ir dar aulas, com uma doença grave, colocado a uma centena de km de casa e da família, com uma direção de turma e várias turmas de diferentes níveis de ensino para saber o que é pêra doce! E estou a ser bonzinho porque há pior! Se há prevaricadores, à boa moda do chico espertismo do português, que se apure a verdade e sejam penalizados por isso para que não pague o justo pelo pecador.
A estratégia política do ME em colocar uns docentes contra outros tem sido eficaz! Uma estratégia que continua porque quando as “moscas” são as mesmas, e perante uma maioria absoluta, a mudança a acontecer, será só para pior. Diria mesmo que tem persistido um tratamento perverso de dividir para reinar, sobretudo, quando coloca docentes a avaliar colegas para a mudança de escalão perante um número reduzido de vagas de acesso aos mesmos gerando uma disputa interna sem precedentes no interior das escolas. Segundo estudos sociológicos recentes, apenas 10% dos professores estão satisfeitos com a profissão, uma percentagem que deveria envergonhar os decisores da governação! Sem falar, e para piorar o cenário, dum ME que, atualmente, ouve e dá mais crédito aos Encarregados de Educação (EE) do que aos docentes, EE protetores em que muitos querem fazer dos filhos aquilo que eles não são ou que eles próprios gostariam de ter sido e não foram na vida.
Não faço ideia de quem são os satisfeitos com a carreira, se são docentes que sempre tiveram na mesma escolinha, com horários bem arrumadinhos, com poucas turminhas e a viverem pertinho da sua casinha, … ou pseudo docentes que vivem enfiados em instituições diversas incluindo do próprio ME e sindicatos. Relembro que sorrimos e rimos quando a vida nos corre de feição, somos assim! Tirem-nos o conforto do lar, da família e o dinheiro e, num ápice, silenciamos o riso e a expressão facial do sorriso desaparece de vez porque também somos assim! Infelizmente, e porque também sou docente, vejo cada vez mais uma classe umbiguista que deixa à tona o carácter, ou falta dele de muitos e que me envergonha porque não é esta a Escola que idealizei quando entrei na carreira e que, infelizmente, hoje sabemos que poucos nela querem ingressar.
Uma classe que continua, há décadas, dividida em contratados, em quadros de zona pedagógica, em quadros de escolas, em escalões confortáveis para uns e inalcançáveis para outros, em falsidades e mentiras e com mais de uma dezena de sindicatos que servem mais para dividir do que para unir, dificilmente, teremos nos próximos tempos uma escola melhor! Infelizmente, somos governados por políticos que, há quase 50 anos, não conseguiram ainda resolver o problema da colocação de docentes. É preciso ter coragem de valorização a residência de quem vive numa região, concelho ou localidade como determinante para solucionar este eterno problema.
Termino com uma lapalissada, não há escola, sem alunos, mas também não há escola, sem professores! Ainda assim a envelhecida classe docente, maltratada e esgotada como nunca visto, num ato nobre e heroico, mas, infelizmente, pouco reconhecido, tudo faz, e é o que importa em tudo isto, para ensinar os seus alunos. Um ótimo e feliz dia para todos! ◄
- Publicado no Jornal PALAVRA, edição de setembro 2022
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