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2023

A ansiedade de começar mais um ano é real, está vivinha da silva, não posso dizer que se recomende, mas não tenho como lhe negar a relevância. Sempre me considerei uma pessoa ritualística, e com mais ou menos racionalidade vou fazendo pequenos ritos que na minha cabeça parecem imprescindíveis para que o resto do dia, ano, ou vida, se dê sem grandes problemas. Acredito que seja uma experiência relativamente transversal, em particular no final do ano: numas casas comem-se passas (as exatas doze), outras brinda-se imperativamente com um bom champanhe; algumas pessoas têm de estar a ver os fogos de artifício, outras a dar o beijo da meia-noite; algumas escrevem retrospetivas e traçam planos, outras manifestam desejos e fazem promessas; mas todas, de uma forma ou de outra, entendem o fim de uma coisa como o princípio de outra, regra geral melhor, ou assim se antecipa.
Não surpreende, portanto, que a páginas tantas a ansiedade comece a tamborilar alma adentro: é que nestes rituais existe, evidenciada ou não, a expetativa de que o que está para vir será grandioso, transformador, novo e melhor. E paira no ar essa expetativa e, em almas mais determinadas, essa pretensão: nas subscrições do ginásio (que por certo sentirão um pico de crescimento a cada janeiro), nos frigoríficos repletos de vegetais, nas mensagens carinhosas, na presença, na ausência, na postura. “Desta é que é”, “vou ser o meu melhor eu”, “este ano vou investir em mim”, “esperem para ver”. As passas, os brindes, os foguetes lá fora, tudo a contribuir – desta é que é! E por muito que o entusiasmo sobressaia nesses imediatos, os primeiros dias de janeiro começam sempre com a aflição de já estar dois…três… quatro dias (!) atrasada para começar a jornada de ser quem me propus a ser à décima segunda passa de uva.
Mas com ou sem ansiedade, o começo é sempre uma coisa bonita. Passei os últimos dias de 2022 a pensar nos próximos 365 de 2023; no que quero ser e no que quero que seja; muito, também, no que quero que deixe de importar. E partilho convosco como antecipo este ano (na certeza de que a esta publicação regressarei em Dezembro, esperando que com orgulho, temendo que com desilusão): vou escrever a tempo e horas este meu diário de bordo; vou melhorar a qualidade do meu sono; vou aprender a gostar de couves porque já não sou nenhuma criança; vou entrar nos 30 a romantizar a próxima década e não paralisada pelo medo da inevitável passagem do tempo; vou aceitar que ir ao médico faz parte da vida e que não preciso de ligar à minha mãe (desculpa, mãe) sempre que me dói qualquer coisinha; vou estar mais vezes com a minha avó; vou ter mais paciência com a Patanisca; vou cuidar da minha casinha como ela merece ser cuidada (no sentido literal e figurativo porque a minha casinha é tanta coisa e tanta gente que merece muito mais cuidado do que aquele que a Leonor de 2022 lhe dava!). O que não vamos fazer em 2023? Deixar que seja só mais um, mas aceitar que, a sê-lo… está tudo bem. Ou vai ficar.
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  • Publicado no jornal PALAVRA, edição de janeiro 2023

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