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Habitação

Por uma vez, e sem exemplo, vamos acompanhar a onda e escrever um pouco sobre o tema “da moda”; a questão da habitação, e é da moda porque a bolha mediática assim o dita, uma das estranhezas desta “sociedade do espetáculo” é que só nos preocupamos com algo que “alguém” quer que nos preocupemos.
O que não significa que não seja um tema importante, sempre o foi, está aliás previsto na constituição da República Portuguesa o direito á habitação e isso, por si só, revela a importância do tema na vida de todos nós, reconhecido aliás pelos primeiros constitucionalistas na redação da nossa constituição, o documento base e alicerce da nação.
Posta de parte a questão da pertinência e importância do tema, importa agora dissecar um pouco, nos limites de alguns caracteres que nunca abarcam todas as dimensões de um problema que é complexo.
Na minha opinião, existem duas principais razões para esta “crise” habitacional; uma delas foi a vertiginosa corrida ao alojamento local em Portugal na ultima década, e na qual nem tudo foi mau, muito longe disso; resolveu-se o “problema” de muita casa fechada que até esse momento era um mono e passou a ser uma fonte de rendimento, criou-se uma resposta a quem nos quer visitar, gerou-se dinheiro, rendimentos e criou-se emprego, muitas vezes autoemprego, especialmente em concelhos do interior como Reguengos, e não de somenos importância, o alojamento local, através da reabilitação de edifícios, foi a grande boia de salvação do sector da construção civil (e adjacentes) na ultima década, convém lembrar que muitas das empresas do sector saíram titubeantes dos anos da troika, as que saíram, porque em Reguengos de Monsaraz um terço das empresas de construção civil deixou de existir nos chamados anos da Toika (2011 a 2014).
A outra principal razão que aponto é a questão dos chamados vistos gold, estas autorizações de residência especiais, foram criadas pelo XIX governo constitucional em 2012, liderado por Pedro Passos Coelho, e diga-se, tendo esta iniciativa a batuta cirúrgica de Paulo Portas, este convite a milionários para residirem e investirem no mercado imobiliário (+ de 90% do investimento feito) em Portugal, abriu também o espaço comunitário a capital privado chinês, angolano e Brasileiro, por exemplo, o convite foi feito, eles vieram, compraram e inflacionaram.
Agora chegou o momento de lidar com o reverso da medalha, com os efeitos mais negativos e perversos, veremos se as medidas apresentadas serão suficientes – provavelmente não, se a reversão da situação vai levar alguns anos – provavelmente sim, será mais um desafio para o atual governo, depois das cheias, dos trágicos incêndios de 2017, da luta contra o Covid19 e a minimização dos seus efeitos na economia, da inflação e da subida das taxas de juros, se formos otimistas acharemos que será apenas mais um dia no escritório para António Costa.
O que não podemos, ou não devemos é agora ignorar o prato que coletivamente nos alimentou anos a fio, ou não ter memoria, ou ter memoria, mas esta ser seletiva ou conveniente, estejam á vontade para escolher.◄

 

  • Publicado no Jornal PALAVRA, edição de março 2023

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